2007-09-13

Bilingüismo é para todos!

Acho que descobri por que aqueles que gostam do esperanto (eu, por exemplo) muitas vezes espantam os que não estão informados a respeito do assunto. O entusismo, o fervor mesmo, com que os esperantistas alardeam esse idioma faz com que se pareça uma espécie de seita religiosa, para quem olha de fora, sem saber o porquê de tanta propaganda.

Às vezes até se brinca, ao se descobrir um novo samideano:

- É, esse é mais outro que pegou o vírus verde.

A referência ao verde não é casual, significa, sim, a esperança em um mundo mais igualitário: o próprio nome da língua e diversos outros símbolos evocam isso. Por causa desse aspecto idealista é que muitas religiões o adotam como um instrumento facilitador da expansão do sentimento de fraternidade incondicional, aproximando mais os homens, já que a barreira da comunicação seria assim derrubada.

Mas fora do âmbito religioso ou espiritualista, essa idéia não passaria de uma simples utopia, coisa de gente sonhadora. Para os pragmáticos e para os materialistas, pura perda de tempo. Afinal, mesmo entre marido e mulher, que deveriam se entender muito bem, o mais comum são brigas constantes. Por isso a estranheza ao se deparar com o esperantista insistente, tentando convencê-lo de que "a cor verde é mais bela que a azul" ou que "banana é mais gostosa que morango".

Eu mesmo não me sinto muito à vontade sendo rotulado como integrante das fileiras dos escudeiros quixotescos (com todo o respeito, não me levem a mal). Mas devo admitir que na hora de defender o esperanto, sou quase tão chato quanto um prosélito do "senhor" Bispo Macedo.

Quando descobri isso em mim, paixão incontrolável, emoções à flor da pele, durante qualquer debate com o "público externo", fiquei muito surpreso com minha incapacidade de mostrar o esperanto como simplesmente uma língua, uma alternativa de comunicação democrática. Parecia que eu estava defendendo um filho contra a calúnia!

Parei para pensar, olhei criticamente para mim mesmo. E agora vejo qual é a principal motivação que me leva a praticar, aplicar e a viver o esperanto com tanto ardor. Agora é a hora, tenho que ser sincero comigo mesmo e com os outros. O motivo principal é muito simples:

"Eu não gosto de ser passado para trás!"

Não aceito entrar em um jogo em desvantagem, abomino qualquer malandragem, "esperteza", enganação, exploração. Não quer dizer que eu não saiba perder. Sei sim, mas só se for com todas as cartas na mesa, sem ás de copas escondido na manga, jogo limpo. E isso com certeza não é o que está acontecendo no cenário lingüístico do momento. As regras atuais da comunicação global são:

  1. Alguns povos, cuja língua nativa está sendo usada vastamente, têm a grande vantagem de não precisarem gastar tempo nem dinheiro para aprender outro idioma estrangeiro, pois "tudo" já é escrito e divulgado nesta sua "língua internacional de facto", que subiu ao pódio "naturalmente" e por isso deve ser aceita como regra incontestável.
  2. Os outros povos, a grande maioria, devem penar para alcançar um nível adequado de capacitação nessa língua, para poderem se comunicar com todos os outros, tanto nas situações em que estão em seu próprio território, quanto quando viajam para outros países.


Ou seja, a alguns deve ser aplicado o bilingüismo, enquanto outros podem viver confortavelmente na comodidade trazida pelo monopólio lingüístico global, imposta por interesses puramente econômicos. É a lei dos mais fortes ainda dominando, onde "uns são mais iguais que os outros".

Afinal, quem deve escolher a língua auxiliar para intercâmbio global? Depois de conhecer o esperanto, tenho a certeza de que sou eu, individualmente, quem posso fazer essa escolha. De outro modo, seria obrigado a aceitar a imposição externa.

Agora tenho consciência por que também fui infectado pelo vírus verde. E já sei qual o melhor argumento para chatear os adeptos do "fuck you". Com o esperanto, podemos gritar abertamente, sem vergonha nenhuma:

"Bilingüismo é para todos!"

2 comentários:

Marcus disse...

Cara, gostei deste post coloquei um link no meu blog para o teu (talvez depois eu comente algo lá, por enquanto tem apenas o link discreto no lado, hehe).
O link do meu blog é http://marcuscf.wordpress.com/

Ah, achei o teu pelo Orkut, na comunidade Esperanto Brasil.

Marcus Aurelius.

Michel Castelo Branco disse...

Felipe, adorei o artigo. Gosto de sua atitude. Comecei a escrever sobre isso ontem, e criei um blog não para agradar a alguém, mas para organizar algumas idéias e conhecer outros pontos de vista.
Quanto ao "emeil" do UOL, acho importante sim registrar a reclamação. E, aliás, acho que vou começar a chamar isso de "retmesaĝo". Já é um bom tema para um próximo artigo.

Michel
http://pense-verde.blogspot.com/